quarta-feira, 16 de junho de 2010

Reféns

- Alguma vez, tu já te apegou?
- Sim.
- É. Mas existe uma infinidade de coisas as quais alguém pode se apegar: uma roupa, um objeto, um santo, uma droga, dinheiro...
- Então a que, exatamente, tu te referes?
- Pessoas.
- Pessoas??
- Sim, pessoas.
- Ah, claro. Tenho meus pais, meu irmão...
- Tá, mas com exceção das pessoas da tua família. Tem alguém a quem tu já te apegou? E eu não tô falando daquele apego que a gente tem geralmente com alguns colegas de escola. Eu falo de algo mais forte.
- Huum... Acho que não.
- Sorte a tua.
- Por que?
- Por que sim. As pessoas te prendem, te viciam.
- Mas como?
- Imagina que tu gosta muito de alguém. Tu te acostumas a companhia agradável da pessoa, só consegue pensar no quanto é bom, no quanto vocês se divertem juntos. E então, aos poucos, sem perceber, tu vais ficando viciado na pessoa. Ela começa a estar constantemente no teu pensamento e tu anseia pelo próximo encontro. Tu passa a ser capaz de cancelar qualquer outra coisa que iria fazer, só pra poder estar com ela.
- Mas não é bom ter alguém que te deixa tão animado e feliz?
- Sim, é sim. Mas o problema é que o tempo passa.
- Como assim?
- O tempo muda as pessoas. Aquele alguém com quem tu gosta tanto de passar o tempo não vai passar o resto de sua vida passando o seu próprio tempo só contigo (e isso é algo em que, na maioria das vezes, a gente não pensa em nenhum momento). Ele vai conhecer novas pessoas, entrar em contato com novos ambientes. E essas pessoas, esses ambientes aos poucos podem mudá-lo.
- Mas não é a coisa mais natural do mundo, as pessoas mudarem?
- Sim. Mas o fato é que tu vais assistindo aquela pessoa a quem tu te apegou tanto mudando. Cada novo encontro só faz com tu que perceba o quanto as coisas estão diferentes, como não é mais a mesma coisa. Tu até se esforça pra que possam voltar a ser como antes, mas chega um momento em que tu vê que a pessoa a quem tu se apegou tanto, não está mais tão interessada assim, às vezes ela nem esta mais lá, e então tu para de se esforçar. Aquilo que foi tão bom e te fez feliz por um tempo acaba e tudo o que sobra é o apego que dolorosamente continua tão forte quanto antes.
- Mas e dai? O que acontece?
-Bem... a gente acaba tendo que reaprender a viver como se vivia antes da coisa toda começar. Tu vais achar difícil pra caramba no começo, pensar que vai ser impossível de se acostumar, mas daí a tua capacidade de se adequar te mostra que tu só precisava de uma coisa: tempo.
- É, eu entendo. Mas o teu ponto de vista não pode ser generalizado. Isso não é algo que acontece com todos.
-É isso é verdade. Como dizem, cada caso é um caso.
-Exatamente. Bem, amanheceu, parece que já tá na hora.
-É mesmo. Bom, nos vemos mais tarde então?
-Com certeza.
-Então até mais, agora preciso acordar.

4 comentários:

  1. "mas daí a tua capacidade de se adequar te mostra que tu só precisava de uma coisa: tempo."
    Concordo plenamente ;)

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  2. Lembrando que não precisamos mudar de amigos contanto que aceitemos que nossos amigos mudem.


    No mais, final interessante...

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